David Sloan Wilson, biólogo evolucionista norte-americano, é uma das principais referências contemporâneas no campo da teoria da evolução, com destaque para seus trabalhos sobre seleção multinível e suas aplicações fora da biologia estrita. Em This View of Life: Completing the Darwinian Revolution, publicado em 2019, Wilson propõe expandir os princípios da teoria evolutiva para todas as esferas da experiência humana — da moral à economia, das instituições à política pública — defendendo que só assim a revolução iniciada por Darwin será realmente completada.
Li dois dos autores com quem David Sloan Wilson dialoga recentemente: Elinor Ostrom e Jonathan Haidt. Com Ostrom, o diálogo é direto e central. Wilson reconhece nos princípios de design identificados por ela — regras claras, participação nas decisões, monitoramento mútuo, sanções proporcionais — a expressão de um processo evolutivo que favorece grupos cooperativos. Ele interpreta esses princípios como adaptações culturais selecionadas por sua eficácia em manter a coesão e o funcionamento coletivo, propondo sua aplicação deliberada a escolas, empresas, comunidades e instituições. No caso de Haidt, é ele quem cita Wilson como referência para sustentar sua tese de que a moralidade humana evoluiu para fortalecer a coesão de grupos, e não apenas para orientar decisões individuais. Ambos compartilham a ideia de que emoções morais e estruturas culturais são mecanismos evolutivos de regulação social.
Em This View of Life: Completing the Darwinian Revolution, David Sloan Wilson propõe que a teoria da evolução não seja vista apenas como uma explicação para a diversidade biológica, mas como uma ferramenta para compreender e transformar a vida social humana. A obra avança na direção de uma síntese ampla, onde biologia, cultura e instituições são entendidas como partes de um mesmo processo evolutivo.
A primeira tarefa é desmistificar o darwinismo social e a ideia de que a evolução justifica egoísmo, desigualdade ou competição desenfreada. Wilson mostra que essas interpretações distorcem o pensamento de Darwin e impediram a integração entre biologia e ciências humanas. Em vez disso, ele defende que a cooperação, a empatia e o comportamento pró-social são resultados da seleção natural, especialmente quando analisados sob a lente da seleção multinível — a ideia de que grupos cooperativos têm vantagem evolutiva sobre grupos desorganizados.
Para aplicar a teoria da evolução de forma eficaz, Wilson apresenta um conjunto de ferramentas conceituais derivadas da biologia, em especial as quatro perguntas de Tinbergen (função, desenvolvimento, mecanismo e história evolutiva), e mostra como elas podem ser usadas para compreender desde bactérias até instituições humanas.
A partir dessa base, o autor propõe que a formulação de políticas públicas seja vista como uma extensão da biologia: um processo de experimentação contínua que visa ajustar regras, normas e práticas ao ambiente social. Ele oferece exemplos de como práticas modernas — como a escolarização precoce ou o excesso de higiene — podem produzir efeitos adversos por não respeitarem as condições evolutivas sob as quais corpos e mentes humanas se desenvolveram.
Um dos desafios centrais do livro é explicar como a bondade, a cooperação e o altruísmo emergem e se mantêm em um mundo competitivo. Wilson mostra que esses comportamentos só se tornam estáveis quando existem mecanismos sociais que punem exploradores e recompensam contribuições coletivas.
A evolução cultural, segundo Wilson, é um processo muito mais rápido do que o genético. O sistema imunológico, o aprendizado individual e as práticas culturais funcionam como versões aceleradas da seleção natural. Ele ilustra isso com exemplos de populações indígenas e mostra como a perda de tradição cultural pode provocar colapsos equivalentes à extinção funcional. Cultura, nesse sentido, é uma forma de herança tão crucial quanto o DNA.
A cooperação bem-sucedida depende de certos princípios organizacionais universais, identificados por Elinor Ostrom em seus estudos sobre recursos comuns. Wilson mostra como esses princípios — como regras claras, equidade, participação e sanções proporcionais — podem ser aplicados em escolas, empresas, igrejas e bairros.
O indivíduo, longe de ser uma unidade isolada, é apresentado como um produto de relações sociais e evolutivas. Traços considerados pessoais, como desempenho ou saúde mental, são moldados por contextos coletivos. A partir de estudos em neurociência, psicologia e educação, Wilson mostra que o bem-estar individual depende da qualidade das relações e dos grupos aos quais pertencemos.
O autor encerra o livro com a proposta de que a sociedade humana poderia e deveria guiar a evolução para funcionar como um superorganismo, análogo a um organismo multicelular ou a uma colônia de insetos sociais. Para isso, seria necessário criar sistemas cooperativos coordenados. A experiência da igreja celular na Coreia do Sul é apresentada como exemplo de como pequenos grupos coesos podem operar em rede sem perder identidade local. Essa visão, no entanto, não me agrada. A noção de uma evolução guiada em direção a um grande superorganismo, em que cada parte teria uma função presumida dentro de um todo integrado, carrega uma concepção excessivamente funcionalista da vida social. Embora seja útil pensar a cultura e as instituições como sistemas sujeitos a processos evolutivos em múltiplos níveis, isso não implica que o destino desejável seja um sistema único, ordenado e coeso.
Vejo com mais simpatia a abordagem inspirada na diversidade institucional. Como mostra Michael Munger no artigo Endless Forms Most Beautiful and Most Wonderful, instituições humanas são como espécies em um ecossistema: cada uma representa um equilíbrio possível dentro de contextos específicos, e sua sobrevivência depende tanto de eficiência quanto de contingências culturais e históricas. Assim como na natureza, não há um único formato ideal — há uma multiplicidade de formas, estratégias e arranjos que coexistem e interagem em dinâmicas complexas.