Publicado em 1989, Rediscovering Institutions marca uma inflexão teórica importante no campo da ciência política ao propor uma revalorização do papel das instituições na explicação da ação política. Escrito por James G. March e Johan P. Olsen, o livro surge como uma reação ao predomínio de abordagens racionalistas e comportamentais que, nas décadas anteriores, reduziram a política a agregações de preferências individuais e escolhas estratégicas. Sua publicação ocorre no contexto do chamado "novo institucionalismo", movimento intelectual que procurou recolocar as instituições no centro da análise política, mas com diferentes enfoques. March e Olsen são associados à vertente sociológica do novo institucionalismo, ao enfatizarem a dimensão simbólica, normativa e cognitiva das instituições. Ao contrário do institucionalismo da escolha racional — centrado em regras como restrições estratégicas — e do institucionalismo histórico — voltado à análise de trajetórias e dependência de percurso —, March e Olsen propõem uma abordagem que vê as instituições como estruturas que moldam preferências, identidades e significados, organizando a ação segundo uma lógica de adequação mais do que de consequência.
Longe de serem apenas estruturas formais ou arranjos funcionais, as instituições são apresentadas como sistemas simbólicos e normativos que moldam identidades, expectativas e padrões de comportamento. Elas não apenas organizam o fazer político, mas também estruturam o que é possível imaginar, reivindicar e reconhecer como legítimo. A ação política, nessa perspectiva, é orientada pela lógica da adequação: indivíduos agem segundo o que é considerado apropriado, com base no papel que ocupam e nas normas que regem determinado contexto. O comportamento político é frequentemente menos fruto de cálculo estratégico do que de encarnação de papéis socialmente construídos.
Essa orientação normativa se manifesta nas rotinas institucionais e nos procedimentos operacionais padrão, que reduzem incertezas e tornam viável a coordenação em contextos de alta complexidade. Agentes não precisam reavaliar objetivos a cada passo: agem porque confiam em regras sedimentadas, que indicam o que deve ser feito, por quem, quando e como. Ao mesmo tempo, as instituições organizam o sentido da ação. Elas oferecem linguagens, símbolos e categorias que tornam o mundo político inteligível, legitimando decisões, identidades e vínculos por meio de narrativas e rituais. Essa dimensão interpretativa — a institucionalização do sentido — é fundamental para compreender a estabilidade e a legitimidade das práticas políticas.
A crítica aos modelos dominantes da ciência política emerge a partir dessa concepção ampliada de instituição. O modelo da competição racional, que reduz a política a interações entre atores maximizadores de interesse, é considerado limitado por pressupor preferências fixas e desconsiderar o papel formativo das instituições. Já o modelo da classificação temporal, associado ao garbage can model, descreve decisões como encontros aleatórios entre problemas, soluções e atores, mas também falha ao negligenciar como as instituições estruturam esses encontros, oferecendo consistência simbólica e organizacional mesmo em contextos de ambiguidade.
March e Olsen propõem uma teoria da mudança institucional que foge tanto das grandes rupturas quanto do automatismo funcionalista. As instituições mudam lentamente, por acomodações incrementais, reinterpretações simbólicas e processos de aprendizagem. Reformas radicais são frequentemente absorvidas pelas rotinas existentes e, longe de transformarem a prática, funcionam como performances simbólicas. Servem para sinalizar compromisso com a modernização ou com a resolução de conflitos, mas sem alterar de fato os padrões de ação. A reforma institucional, nesse sentido, é mais ritual do que ruptura.
A análise se aprofunda com a distinção entre lógica agregativa e lógica integrativa. A primeira concebe a política como soma de preferências individuais; a segunda, como construção de compromissos coletivos e identidades compartilhadas. Quando a lógica agregativa domina, a política se reduz à administração de vontades dispersas, sem um projeto comum que dê coesão à ação coletiva; quando a lógica integrativa prevalece em excesso, corre-se o risco de sufocar a diversidade e impor identidades coletivas rígidas. Instituições democráticas robustas devem equilibrar essas duas lógicas, garantindo tanto a representação quanto a formação de sujeitos políticos capazes de agir em comum.
Um dos pontos centrais do livro é a crítica à ideia de que preferências políticas são dadas, naturais ou fixas. Preferências são construídas socialmente, moldadas por normas, experiências e contextos institucionais. Isso significa que o poder político não se limita à tomada de decisão, mas inclui também a formação do que pode ser desejado ou reivindicado. A política é o espaço onde se define o que é legítimo querer. Em contextos de profunda desigualdade, essa dimensão se torna ainda mais relevante. Sem instituições capazes de formar sujeitos, integrar diferentes grupos e promover reconhecimento mútuo, a democracia corre o risco de se reduzir a uma formalidade vazia, incapaz de garantir participação efetiva e distribuição justa de poder.
Em um dos momentos centrais da obra, os autores apresentam a dinâmica dos ciclos de purificação e reconstituição institucional. As instituições alternam momentos em que reforçam sua identidade e fronteiras normativas (purificação) e momentos em que se abrem à ambiguidade e à adaptação (reconstituição). A estabilidade institucional é sempre relativa: ela convive com tensões internas, contradições e a necessidade constante de acomodar complexidades sociais. A política, nesse quadro, não é apenas escolha entre alternativas, mas disputa sobre o que conta como legítimo, possível e desejável.
Rediscovering Institutions oferece uma contribuição fundamental para a teoria política ao recolocar as instituições no centro da análise, não como meras regras formais, mas como estruturas simbólicas que moldam comportamentos, identidades e preferências. Ao desenvolver conceitos como lógica da adequação, institucionalização do sentido e ciclos de mudança, o livro amplia as ferramentas para compreender tanto a estabilidade quanto a transformação da vida política. Em um cenário de crise institucional e polarização, sua proposta segue relevante: compreender a política exige entender como as instituições organizam não apenas o que se faz, mas o que se pode pensar, desejar e disputar coletivamente.