Discurso de posse da Adusp
Passei no concurso para docente da USP em 2013 com alegria e orgulho. Imaginava que faria parte de uma instituição acolhedora, com estabilidade e estrutura para o trabalho intelectual. Mas, logo descobri que cada recurso básico — uma sala, um computador, um monitor — exigia um edital, um projeto, uma comprovação. A lógica da universidade não era a de acolhimento, mas a da produtividade e das contrapartidas.
O que mais me surpreendeu foi perceber que esse sentimento de pertencimento institucional, que eu esperava encontrar na USP, encontrei no sindicato. A Adusp me ofereceu estabilidade, continuidade, amparo coletivo — aquilo que uma instituição deve oferecer. Foi nesse contraste que passei a ver a Adusp não como um espaço burocrático, mas como uma verdadeira instituição, feita de vínculos duradouros e sentido compartilhado.
Vivemos um tempo de crise institucional. Parte significativa da sociedade vê nas instituições não um canal legítimo de representação, mas um obstáculo. Essa desconfiança abre espaço para soluções imediatistas, lideranças autoritárias e rupturas que enfraquecem a democracia. É nesse contexto que entidades como a Adusp se tornam ainda mais necessárias, como espaços que sustentam a mediação, a continuidade e a articulação coletiva.
A Adusp representa os docentes enquanto trabalhadores. Para além das reivindicações salariais, ela estrutura identidades, vínculos e compromissos. Uma instituição, afinal, é um arranjo que permite transformar vontades diversas em ação comum. Ela impõe limites e regras, mas também oferece coordenação e força coletiva. O desafio é sempre equilibrar diversidade e unidade, autonomia e representação.
Esse equilíbrio exige também conciliar inovação e tradição. A renovação trazida por docentes mais jovens é essencial, mas ela precisa se articular com a experiência acumulada de quem já trilhou esse caminho antes — colegas da diretoria ampliada, funcionários e militantes históricos que sustentam o dia a dia da entidade. O novo só se realiza com responsabilidade quando reconhece o valor do que já foi construído.
A relação da Adusp com a reitoria é, por definição, uma relação de tensão legítima. A entidade defende direitos, enquanto a reitoria administra recursos e políticas. Mas essa tensão é produtiva. A mediação institucional permite diálogo, negociação e estabilidade. Sem uma entidade como a Adusp, as demandas se tornariam difusas, frágeis, instáveis.
Mas essa mediação não acontece automaticamente. Ela precisa escutar as insatisfações, transformá-las em pauta, dar forma coletiva ao que surge de modo disperso. Quando isso falha, cresce o risco de frustração e desagregação. É por isso que as estruturas representativas — assembleias, conselhos, grupos de trabalho — são tão importantes. Elas são o que garante legitimidade e transparência à participação.
A tensão com o governo estadual também é parte do papel da Adusp. A defesa da universidade pública exige confronto com a lógica fiscalista que orienta o financiamento público. Mas esse enfrentamento precisa ser autônomo — inclusive em relação a partidos políticos, mesmo os que compartilham parte de nossa agenda. É essa autonomia que sustenta a legitimidade da entidade.
A força da Adusp também está nas alianças. Dentro da USP, ela atua ao lado do Sintusp e do DCE. No plano estadual, compõe o Fórum das Seis, que estrutura as negociações com o CRUESP. Nacionalmente, é parte do Andes. Essas conexões ampliam nosso alcance e nos situam em uma rede maior de defesa da educação pública.
Defender a Adusp hoje é apostar na ideia de uma universidade realmente pública, plural e democrática. É reconhecer que instituições legítimas precisam se transformar, abrir-se a novas vozes e expectativas, sem perder o acúmulo que as sustenta. Não se trata de blindá-la a críticas, mas de fortalecê-la como espaço de mediação, pertencimento e construção coletiva.
Em 2022, quando enfrentei um momento pessoal difícil, fui acolhido pela Adusp. Usei um direito que poucos conheciam: a licença remunerada para dirigentes. Colegas abriram mão desse direito para que eu pudesse me cuidar. Quando melhorei, quis retribuir. Me aproximei da diretoria, aprendi com os colegas e com os funcionários. Me senti parte de uma conversa longa, iniciada muito antes de mim.
Agora, ao assumir a presidência da entidade, quero honrar essa história. Quero escutar, aprender, cuidar da equipe e estar à altura da confiança que recebi. Mas também quero que seja divertido. Construir uma instituição pode ser também uma alegria, uma oportunidade de criar vínculos, imaginar caminhos e convidar outras pessoas a se engajar. Que esse seja nosso espírito: compromisso, abertura e entusiasmo.